Um filme de Alain Resnais de 1961, com roteiro
de Allan Robbe-Grillet, trata da ruptura da memória provocada pela morte. Num
luxuoso e enorme palácio, transformado em hotel, entre corredores, salões
decorados e estátuas, um estranho tenta convencer uma mulher casada a fugirem
juntos. Ele diz conhecê-la. Diz que foram amantes. Entretanto, parece difícil
fazê-la lembrar de que tiveram um relacionamento (ou que não tiveram) no ano
passado, em Marienbad.
Seria muito simples se a
narração obedecesse à seqüência dos fatos, uma ordem cronológica e houvesse
nomes de personagens, mas este filme absolutamente maravilhoso em todos os
detalhes revolucionou a linguagem cinematográfica e criou as bases para uma
nova Sétima Arte, gerando soluções e recursos mais tarde aproveitados por todos
os grandes cineastas como Stanley Kumbrick, Roman Polanski e o mais recente Joe
Whight (Orgulho e Preconceito).
A ruptura da
memória é provocada pelo assassinato do marido traído que atinge a mulher que
se apaixona por outro. Ela é eliminada exatamente quando decide fugir com o
amante, depois de voltar atrás de uma decisão: tinha proposto ficar um ano
longe dele, uma espécie de teste, para ver se o caso era para valer, se o
amante estava realmente apaixonado dela. Mas foi convencida a fazer as malas e
deixar o marido, que praticava tiro e não permitiu a desonra.
Marienbad é narrado pelo
amante que tenta lembrar a mulher do acordo que fez um ano antes, o de ficar um
ano separados para que as coisas se resolvessem. Ela, fantasma, que vaga pelo
cenário da sua morte, não lembra de nada e pede que o deixe em paz, mas ele a
persegue e a atormenta com as lembranças, exigindo que reencontre aquele
momento em que poderiam fugir juntos, talvez para que fosse possível a fuga
inspirada pelo amor.
O hotel/castelo visto à
noite no plano final, sem vegetação, só granito e pedra, é a representação de
uma tumba. Lá está enterrada a mulher que ousou amar e fugir de um casamento
estéril. E jaz uma elite que treina o tiro enquanto convive de maneira
impassível, indiferente e criminosa, isolada do resto do mundo. A imagem em que
todos aparecem imobilizados no jardim, totalmente fundada no pintor italiano De
Chirico, expressa essa classe social morta.
A memória fragmentada,
precária, escassa, rodeando um sentimento, uma promessa, as dúvidas, levam a
vanguarda do pensamento e da criação para os mais altos níveis da expressão
artística. Houve o desenlace, o crime, e a mulher vaga, morta, pelos corredores
e quartos.
O deslumbre visual, a complexa trama, a qualidade poética do texto, as situações de conflito (como a do jogo em que o marido traído sempre ganha), a presença de personagens que não possuem fala, mas ocupam a tela com a força das histórias inesquecíveis, fazem de Marienbad um filme de mestre que deve ser visto e revisto sempre.
Muito bom! É um filme que realmente tem esses tons sobrenaturais que você descreve, e influenciou muitos outros.
ResponderExcluirGosto de imaginar que eles estão no purgatório... hahahaha