sábado, 30 de março de 2013

Todos contra Joana d’Arc: O Falso Processo de uma Santa


Todos contra Joana d’Arc: O Falso Processo de uma Santa

CHAMADA
Extremamente digna, de fé inabalável e na defesa de sua integridade como pessoa humana. É assim queRobert Bresson apresenta a jovem e corajosa Joana d’Arc no indispensável e belíssimo filme “O Processo de Joana d’Arc“, de 1962.
É indiscutível a importância histórica de Joana d’Arc para o mundo, em especial para Europa. Ícone da religião católica, a Santa Padroeira da França ganhou inúmeras manifestações artísticas sobre sua vida, tanto que a sétima arte tomou posse e realizou incansáveis filmes sobre ela. No entanto, este de Bresson é o que mais se aproxima do verdadeiro processo que levou à fogueira a Santa Guerreira.
O filme conta em detalhes partes do processo que julgou e condenou Joana d’Arc em 1431. Para tanto,Bresson teve acesso aos textos autênticos do processo, a minuta de condenação do mesmo e também recolheu depoimentos e testemunhos do processo de reabilitação que aconteceu vinte e cinco anos depois do ocorrido. Assistir a filmes de Robert Bresson é uma oportunidade única para se repensar o cinema como um todo, e quando ele decidiu falar sobre a Donzela de Orléans, fez de uma forma única e genial.

“Bresson é um objeto estranho dentro da história do cinema…”

Luiz Oricchio, em depoimento nos extras do filme



Por mais que seja de conhecimento geral que o julgamento era uma farsa – pois havia interesse político acima da fé – vamos aos fatos: a França estava em guerra contra Inglaterra – a Guerra dos Cem Anos – que estava dominando o país e Joana ajudava a França a se levantar. Os franceses pró-Inglaterra, prenderam-na, acusaram-na de bruxaria e mais tarde venderam-na para os ingleses. Motivo? Por vencer batalhas, vestida com roupas de homem, e afirmar ouvir vozes da Santa Catarina, Santa Margarida e São Miguel.
Sendo assim, a qualquer preço ela tinha que morrer para acabar de vez com a fama de santa, que naquela época já se espalhara. Foi levada à fogueira por heresia.

“O processo é uma farsa, sem defensor, nem conselheiro.”

Padres, no filme



Quando o filme começa, Joana está presa a meses no Castelo de Rouen e é testada de todas as formas possíveis, desde tortura psicológica a pessoas vigiando-a 24h, sendo interrogada dia após dia. Ela se defende com palavras – e uma extrema fortaleza moral na defesa das ideias e de sua fé – às acusações levantadas pelos juízes de Rouen, pois não tinha conselheiro e nem defensor. O que a confortava eram as vozes das santas e anjos, que não são ouvidas por quem está assistindo o longa – o espectador só tem conhecimento disso através das afirmações da jovem.
Fiel à linha de pensamento do cinema Bressoniano, o filme é breve e intenso. Em seus poucos 65 minutos de duração, não possui muitos recursos cinematográficos, como cenários – o longa se reveza entre o quarto onde Joana está aprisionada, a sala de julgamento e, mesmo no final, a praça pública onde Joana será queimada. Não há uma trilha sonora, e sua protagonista é uma atriz não profissional, ou melhor, uma modelo, como o diretor chamava Florence Delay, que realmente encanta ao interpretar e toma para si este papel de tamanha importância no cinema.

“Roteiro e recorte de cenas acabam problematizando as ideias cinematográficas do diretor, como, por exemplo, sua concepção particular de cine-escritura e de modelo em oposição a ator. Centrado no processo da condenação de Joana, o roteiro recompõe as palavras entoadas, mas que não tinham sido ouvidas.”

Lucas de Castro Murari, em artigo da Faculdade de Artes do Paraná



Uma das cenas memoráveis do longa traz Joana sendo levada no meio da multidão que clama a sua morte. Nela Bresson mostra/filma apenas os pés da jovem a caminho da fogueira, na Praça do Mercado Vermelho, em maio de 1431. Talvez esta seja a cena que defina todo o filme, pois o pé designa igualmente o fim, posto que sempre na caminhada, o movimento começa pelo pé e termina pelo pé, e além disso, pode significar também o livre-arbítrio que Joana escolheu seguir com seu martírio, um símbolo de consolidação e uma forma de poder.
O objetivo de Robert Bresson era buscar o poder da verdade em seus filmes e em “O Processo de Joana d’Arc” ele conseguiu. A figura humana é exposta numa situação limite – enfrentar a morte não é fácil, nem mesmo para uma moça praticamente santa de apenas 19 anos – enquanto mostra a luta do indivíduo contra um poder maior que o dele e como se portar diante desse poder. Tudo isso faz este filme ser indispensável, atemporal e inesquecível para qualquer pessoa. Bresson foi realmente um pensador do cinema.

quarta-feira, 27 de março de 2013

As Damas de Bresson


As Damas de Bresson



chamada
Diferente de todos os filmes de Robert Bresson“As Damas do Bosque de Boulogne” (1945) é um filme de olhares – literalmente – que transborda emoções pelo silêncio e revela a alma dos personagens em cada cena, em especial a da anti-heroína Hélène. Ela é interpretada pela atriz espanhola Maria Casarés, responsável por deixar os cinéfilos fascinados ao roubar a cena com suas expressões inesquecíveis. Mal recebido na época de seu lançamento, este filme é hoje considerado uma das obras-primas do cinema.

“Observe-o como eu te observo.”

Jean Marchat na pele de Jacques,
personagem amigo de Hélène



Na trama, passada na década de 40, Hélène é uma mulher bela, rica e manipuladora. Logo após uma falsa declaração de término de romance com o amante Jean (Paul Bernard), ela é abandonada pelo mesmo, que aproveita o momento e afirma que os sentimentos são recíprocos e o amor já não existe entre eles há um certo tempo, declaração que os libertaria da culpa para seguirem livres com suas respectivas vidas. Porém, ele não imaginava que ela estava blefando.
Para se vingar da humilhação, ferida, em meio a manipulações e negociações, Hélène convence a dançarina de cabaré Agnès (Elina Labourdette) a seduzir e se casar com Jean, para no dia do casamento, contar o passado da jovem ao ex-amante e humilhá-lo na frente da alta sociedade parisiense. Os cenários em que se desenrola o filme são ambientes pertencentes a luxuosa e sombria casa de Hélène e um apartamento no Bosque de Boulogne, conhecido como o pulmão da França, local onde a anti-heroína instala a dançarina para morar.

“Que sejam os sentimentos que tragam os acontecimentos. Não o contrário.”

Robert Bresson



Inspirado em um dos capítulos do romance “Jacques, o Fatalista, e o Seu Mestre”, de Denis Diderot, com diálogos escritos por Jean CocteauBresson manifesta a vontade de conseguir exprimir, no cinema, o interior de um sentimento, de uma emoção verdadeira e uma ideia constante – no caso de “As Damas do Bosque de Boulogne”, a vingança.
Uma curiosidade: não é estranho que esse filme seja chamado de “Perfídia” na Itália, que em bom português – e até mesmo no italiano – significa traição, sem lealdade. Isso pode remeter tanto ao contexto de Jean, que era o amante; ao de Agnès, que entra no jogo por interesse financeiro e mudança de vida; ou mesmo ao da própria Hélène, que se sentiu traída pelo amado.

“Eu terei a minha vingança.”

Hélène (em francês soa mais maléfico/elegante)



Antes que façam um juízo equivocado da protagonista, aqui se faz necessária uma explicaçãozinha do por que Hélène é uma anti-heroína: anti-heroínas não são, necessariamente, frias e calculistas, são apenas mulheres que fogem ao padrão convencional das mocinhas do cinema e literaturas romantizadas. Hélène, não por acaso, carrega o nome da Helena da Grécia – ou melhor, Helena de Tróia -, que desencadeou uma guerra quando decidiu fugir com seu amante, protagonizando uma das maiores tragédias da era greco-romana: “A Guerra de Tróia”. E isso é apenas um exemplo.
Deixando a divagação de lado, Bresson teve formação em pintura – antes de pertencer ao cinema, ele foi artista plástico – e vislumbrava uma abstração formal, recusava as ostentações da sétima arte para tentar mostrar, a sua maneira, um filme que se conta pelos corpos, gestos e objetos, mantendo sua admiração pelo melodrama. Por este motivo foi considerado moderno, sendo tais características distintas nos filmes posteriores, mais práticos e diretos.
O mestre francês presenteia o público com esse clássico inesquecível que mantem a qualidade de um bom filme, com belas interpretações (proporcionando ao público o prazer em assistir um drama romântico com ternura e atenção, sem ter interpretações exageradas, com soluços e gritarias), um ótimo roteiro, uma rigorosa e deslumbrante direção de arte e fotografia, sob cuidados de Philippe Agostini, recebendo elogios até mesmo do cineasta, não menos lendário, François Truffaut.
Os temas apresentados também contribuem bastante para esta obra-prima permanecer entre as melhores do diretor, pois são atemporais, como a traição, a vingança e o próprio amor – neste caso, salvo engano. Como disse uma professora de cinema francês, “As Damas do Bois de Boulogne” é a história de um amor que existe de uma forma que não deveria ser, e talvez por isso – e pelos sentimentos à flor da pele, muitas vezes contidos -, permaneça por tempo indeterminado em nosso imaginário.



ATENÇÃO: TEXTO PUBLICADO NO CINESPLENDOR. NO QUAL FUI COLUNISTA.

domingo, 24 de março de 2013

A Era Beatles: Quatro Homens e Um Legado

CHAMADA
A maior e mais importante banda de todos os tempos, aquela que influenciou gerações não apenas na música, mas na cultura como um todo, também fez sucesso na sétima arte. Sim, Os Beatles, que dispensando apresentações, foram os grandes responsáveis pela invasão britânica que acabou com o domínio norte-americano, liderando a contracultura nos quatro cantos do mundo por mais de uma década.
Quando o quarteto chegou aos Estados Unidos, estava decretada oficialmente a Beatlemania. No programa “Ed Sullivan Show”, por onde passaram algumas das maiores lendas da música, os garotos de Liverpool se apresentaram, rendendo e surpreendendo a nação não apenas pelo rock and roll, mas também pelo bom humor, aquele humor cínico britânico que só o Fab Four poderia fazer.
Nessa época de histeria e idolatria, foi lançado o que seria o primeiro dos cinco filmes do grupo, “Os Reis do Ié-Ié-Ié” (1964) – originalmente, “A Hard Day’s Night”, frase pronunciada por Ringo Starr num dia difícil do quarteto -, acompanhando um álbum com mesmo nome. A velha fórmula daquele período, de fazer filmes com artistas pop, definitivamente não era a proposta deste longa, e isso fica claro quando observamos nos créditos os nomes do diretor Richard Lester, que tinha trabalhado num programa de humor escrachado chamado “The Goon Show” – adorado pelos músicos -, e do roteirista Alun Owen, um escritor de Liverpool conhecido por ter reproduzido alguns diálogos típicos de sua terra natal. Ambos optaram por um estilo realista para relatar um dia do recém-chegado estrelato dos jovens artistas, desde o assédio dos fãs e da imprensa, até a relação desleixada dos meninos com os compromissos da banda.
01O que mais chama atenção na produção são as personalidades artificiais de cada um dos Beatles – que voltariam a aparecer nos filmes posteriores. George aparece como bad boyRingo é um rapaz lacônico e com problemas de autoestima; John é um jovem de língua afiada, sarcástico e irônico; e Paul, o fino rapaz galanteador. Além deles, no filme é impecável a presença do mítico e “intriguento” avô de Paul, interpretado por Wilfried Brambell. Os diálogos espontâneos apresentados na obra, que muitas vezes beiram o nonsense, podem até parecer improvisados, mas não são, e até hoje o filme é considerado cultno meio musical. Quem não vibra com aquele começo, onde eles estão correndo, sendo seguidos por fãs enlouquecidas e com direito a um tombo do George na sequência?!
Nesse contexto surge uma onda de consumismo em tudo que se referia a Beatles: guitarras, carteiras, meias, lancheiras, cortinas e até perucas. Aproveitando toda essa repercussão, e ironizando a situação,“Beatles For Sale” é lançado. No meio disso tudo, com excursões, gravações e após o sucesso de “Os Reis do Ié-Ié-Ié”, a United Artists convocou novamente o produtor Walter Shenon e o diretor Richard Lesterpara realizarem o mais novo filme dos rapazes. Com apoio dos roteiristas Marc Behm e Charles Wood, em 1965, “Help!” é lançado juntamente ao álbum do mesmo nome.
O filme – uma paródia das tramas de James Bond, agente 007 – conta uma aventura muito louca, na qual os Beatles tentam evitar um sacrifício humano e são perseguidos por membros de um culto indiano que querem o anel que Ringo está usando. A produção não teve tanta aceitação quanto a anterior, apesar de ser bem engraçada, e custou o dobro por ser filmada a cores e em algumas locações exóticas. Participaram do filme, além do quarteto protagonista, os atores Leo McKern, Eleanor Bron, Victor Spinetti, John Bluthal eRoy Kinnear. Nessa época, os músicos são condecorados pela Rainha com mérito por trazerem divisas ao Reino Unido.
No dia 01 de setembro de 1967, logo após a morte de Brian Epstein, os Beatles se reuniram para traçar os rumos da banda e decidiram seguir com o projeto “Magical Mystery Tour”. Este projeto geraria sete canções e um filme para a TV pela BBC, fruto de uma experimentação, pois o roteiro e a direção foram assinados pelos próprios músicos e lançados pela Apple Films. O longa é bem psicodélico, e conta uma história que gira em torno de Ringo Starr e sua tia Jessie, que adquirem bilhetes para um passeio (tour) em um ônibus sem um roteiro conhecido pelos passageiros, mas considerado mágico e misterioso pelos seus organizadores. Neste passeio estão todos os Beatles e figuras pitorescas, inclusive uma criança, a jovem Nichola. Durante o roteiro turístico estão presentes mágicos, criando situações inusitadas e algumas vezes pitorescas, e músicas dos Beatles. Também participam da produção os membros da banda Bonzo Dog Doo Dah Band que cantam a música “Death Cab for Cutie” durante a sessão de strip-tease protagonizada pela stripper Jan Carlzon.
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Os críticos da época alegaram duas coisas sobre a produção. A primeira foi o exagero, no filme, de gracinhas particulares dos quatro, as famosas “internas”, não captadas pela audiência; e também a ausência de um roteiro ou enredo que fizesse justiça à trilha sonora – que como todas as outras, alcançou o 1º lugar das paradas rapidamente. Hoje esse filme é estudado em faculdades de Artes, pois é reconhecido como um dos precursores de um tipo de filme de comédia nonsense, cujos principais realizadores são osMonty Python.
Em 1969 foi a vez de uma aventura animada envolver os músicos, e “Submarino Amarelo” é lançado aproveitando sobras musicais que os Beatles gentilmente cederam para o filme – segundo George Martin, eles foram obrigados a fazer a trilha deste filme. Na trama, um lugar chamado Pepperland – onde se respira música -, tem a alegria ameaçada pelos vilões Blue Mennies e os Beatles são chamados para salvar o local. As vozes dos personagens do quarteto no projeto foram dubladas por outras pessoas, e não pelos próprios, e o que seria um desenho sem nenhuma participação dos Beatles reais se tornou um marco da animação, até hoje um ícone da história cinematográfica. Aliás, os próprios Beatles gostaram tanto do produto, que fizeram uma ponta no final da fita.
O último e derradeiro filme, “Deixa Estar”, foi lançado em 1970 com a ideia de mostrar a banda gravando e criando um álbum em estúdio. Entretanto, quando começaram as gravações os Beatles viviam uma série de conflitos, e quando o filme foi lançado eles já haviam se separado. Por esta razão o longa é reconhecido como documentário sobre o fim da banda, pois as câmeras captaram além das gravações, discussões e desinteresse. O filme foi dirigido por Michael Lindsay-Hoog e contou com a participação de Billy Preston nos teclados. No fim da projeção há um show realizado no telhado do estúdio da Apple, e algumas músicas gravadas durante as filmagens jamais foram lançadas oficialmente pelo grupo. O filme levou o Oscar em 1971 de Melhor Canção e o Grammy com Melhor Trilha Sonora, no mesmo ano.
Depois de tudo isso dá para se ter uma ideia do legado que esse grupo deixou, e não somente para o mundo da música, pois a genialidade dos Beatles acompanha a história, todo tipo de arte, e eles continuam atemporais. Realmente fizeram um serviço de utilidade pública para humanidade. Felizes somos todos nós que tivemos os Beatles. Mesmo que não ao vivo, apenas em filmes e belas canções, eles são eternos.

O filme vencedor de Oscar Favorito

A entrega do Oscar faz parte da premiação mais respeitada e importante do cinema mundial. Contar com um prêmio destes pode alavancar ou destruir a carreira dos profissionais da área, consagrar um azarão ou mesmo marcar o nome de alguém/alguma obra na história da sétima arte.



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Minha Bela Dama

My Fair Lady (1964)
por Bruna Chagas
O cinema muitas vezes pode ser a causa de verdadeiras lições na vida das pessoas, até mesmo algo transformador quando diz respeito ao sentimento, vícios e virtudes do ser humano. Isso é comprovado divinamente quando se trata do filme “Minha Bela Dama” (1964).
Nesta impecável e adorável adaptação para a sétima arte do sucesso da Broadway, vencedora de 8 Oscar em 1964, Audrey Hepburn brilhantemente dá vida a vendedora de rua, meio histérica, Eliza Doolittle. Após uma aposta, um arrogante professor de linguística chamado Henry Higgins (interpretado por Rex Harrison), tenta transformá-la numa dama da alta-sociedade londrina. Após um rigoroso treinamento – e inúmeras situações que, mesmo sem querer, os deixam mais próximos -, Higgins consegue ensinar àquela mulher sem modos a se portar e vai além. Aprendendo mais do que uma lição, Eliza dá sentido à vida dele e o ensina a amar.
Audrey realmente vivencia a florista e até hoje é possível se perguntar o porquê dela não ter ganhado o Oscar de Melhor Atriz por essa interpretação. Com seu estilo espirituoso e divertido, ela faz do longa um belíssimo clássico, literalmente "loverly". 

Cinema Bressoniano: A Vida Como Ela É


Cinema Bressoniano: A Vida Como Ela É



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Um homem que filmou a vida e vislumbrou minutos de eternidade nas ações mais simples do cotidiano. É assim que se pode definir um dos maiores cineastas de todos os tempos, um artista que se serviu da câmera a fim de criar obras-primas e assim o fez durante toda a sua vida. No retorno da coluna “Os Incompreendidos”, em um passeio pela França, é a ele que iremos nos reportar: Robert Bresson.

“Bresson é o cinema francês assim como Dostoiévski é a literatura russa e Mozart é a música alemã.”

Jean-Luc Godard, 2008



Nenhuma afirmativa é tão justa e correta quanto esta acima, pertencente ao cineasta vanguardista franco-suíço Jean-Luc Godard a respeito de outro gênio da sétima arte. Bresson era perfeccionista, católico jansenista e pensava na imagem dos filmes como uma pintura. Preparava cuidadosamente suas obras, criando “leis de ferro” – ou melhor, sua própria lei para o processo de criação. Filmou apenas treze longas em quase meio século, e talvez por isso, muitas vezes, tenha sido incompreendido pelo grande público, embora reconhecido pela crítica.
Assistir a filmes de Robert Bresson é uma oportunidade única para se repensar o cinema como um todo, mas esta assertiva não é para assustar ou intimidar, sim para glorificar seu desempenho. Como um dos criadores de uma nova linguagem na sétima arte, bastante rigoroso, o diretor defendia que o cinema não era teatro filmado e nem aquele que se serve da câmera a fim de reproduzir, mas sim uma revelação, uma representação da realidade, uma manifestação divina da vida, mostrando como ela é de uma forma única e verdadeira.
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É possível afirmar que o cineasta, filósofo e também artista plástico era minimalista (apesar de nunca ter se considerado um, ou mesmo se encaixado em alguma escola que não seja a dele mesmo), por perseguir um método próprio de exigência, sofisticação e cuidado com cada elemento na composição de um filme – como por exemplo, os atores e “modelos” (como chamava os atores que não eram profissionais), que para ele deveriam ser, não parecer ou interpretar um personagem. A verdade das pessoas deveria predominar.
Bresson exigia ainda neutralidade expressiva, e era o que realmente importava. O minimalismo traça, por exemplo, uma linha ou um ponto, fazendo voltas em torno desse símbolo.

“Modelos. O modo deles serem as pessoas do seu filme é ser eles mesmo, permanecer o que eles são.”

Robert Bresson, 2008



Cineasta por excelência, hoje faz parte de uma seleta lista de diretores que são considerados como a principal força criativa na realização de seus longas – ou seja, o cinema de autor -, e o fundamento principal dessa teoria é que o diretor, por ter uma visão global do áudio e imagens do filme, deve ser considerado mais o autor da película do que o responsável pelo roteiro. Assim, são as tomadas de câmera, a iluminação e todos os outros elementos escolhidos pelo diretor que definem os significados expressos no filme, mais até do que o roteiro.
O cinema Bressoniano é assim: único e autoral. O “movimento” teve início em 1934 com “Les Affaires Publiques“, um curta de comédia, caso raro em sua carreira. Seu primeiro longa-metragem, “Anjos do Pecado” (1943), foi rodado após o diretor passar mais de um ano preso num campo de detenção alemão, durante a Segunda Guerra Mundial, fato que também é evocado no filme “Um Condenado à Morte Escapou”, de 1956.
Um clássico do diretor, que talvez seja o único no qual ele usou um artista realmente conhecido, é “As Damas do Bois de Boulogne”, de 1945. Neste longa, o mestre presenteia o público com a interpretação inesquecível de María Casares (1922-1996), atriz espanhola que nos proporciona momentos eternos de uma verdadeira naturalidade feroz, impregnada em todas as cenas, em seu olhar, nos detalhes e lugares doBosque de Boulogne.
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De todas as artes, o cineasta francês era mais ligado à pintura e imagem, do que literatura e música. Ele acreditava que a música no cinema deturpava o drama como se fosse uma droga. Em seus longas é possível notar que não há trilha sonora. “O Processo de Joana d’Arc” (1963) é um exemplo bem característico do cinema Bressoniano: não há trilha musical e a atriz que interpreta a protagonista não era um rosto famoso na época.
Em 1975 o cineasta publicou um livro intitulado “Notas sobre o Cinematógrafo”, uma coletânea de anotações e aforismos próprios, nos quais defende seu ponto de vista sobre a sétima arte. O cinema Bressoniano também inspirou o movimento Dogma 95 – no qual há 10 regras para a produção de filmes, como: não usar cenários, não usar banda sonora, usar apenas câmara de ombro etc. -, e é grande influência dos dinamarqueses Lars Von Trier e Thomas Vintenberg, responsáveis por “Melancolia” (2011) e “A Caça” (2012, inédito no Brasil), respectivamente.
As obras de Robert Bresson tem esse poder transformador na mente do cinéfilo, deixam marcas, seja através de um simples olhar ou um fato histórico que se torna brilhante em sua abordagem natural na tela do cinema. Em 1995, o cineasta recebeu o prêmio René Clair, da Academia Francesa, pelo conjunto de sua obra, falecendo 4 anos depois de causas naturais. Seu legado, entretanto, continua inspirando amantes do cinema no mundo todo.

ATENÇÃO:

TEXTO PUBLICADO NO SITE CINESPLENDOR. 



terça-feira, 19 de março de 2013

Café teatro terá overdose de Lorca

Nos dias 25, 26 e 28 de março, de 14h às 18h  no Café Teatro, Av. Sete de Setembro, 377- Centro a oficina “Lorca Overdose” que está sendo promovida pelo Manauscult. 



A atividade discutirá as peças teatrais da trilogia “Yerma -  A Casa de Bernarda Alba e Bodas de Sangue” do autor espanhol  Federico Garcia Lorca e será ministrada pelo ator Douglas Rodrigues. As aulas fazem parte da contrapartida do PAIC – Programa de Apoio e Incentivo à Cultura, edição 2011, no qual o ator Douglas Rodrigues foi contemplado. Após a conclusão dos projetos artístico-culturais, os vencedores devem apresentar os espetáculos e obras ao público, como vai acontecer com a Lorca overdose. 


No encerramento, dia 28, o ator realizará performance, com três quadros baseados na dramaturgia Lorquiana, com a participação dos próprios alunos.  As inscrições para a oficina já podem ser feitas no Café Tetro, de 13h às 18, gratuitamente. Informações: 3215 2590 

Sobre Douglas

O ator manauense Douglas Rodrigues é licenciado em filosofia pela  Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Formou-se em técnico pela Fundação Rede Amazônica. Foi professor de Arte na Educação, na escola J.K., na Prefeitura de Manaus de 2011 e 2012. No TeatroFoi vice-presidente da Federação de Teatro do Amazonas (Fetam) em 2009, professor de teatro no Liceu de Artes e Ofícios Claudio Santoro em 2010. Em 1999 fundou a AACA- Associação dos Artistas Cênicos- Arte & Fato.      Em 2012 recebeu o Prêmio Myriam Muniz de Circulação na região Amazônica com o espetáculo O Dia que a Terra Dançou, ministrou oficinas no Estado do PA e AM, pelo projeto. Atualmente está produzindo o espetáculo Cênico Musical – Simplesmente MAYSA, estrelado pelo cantor Sinézio Rolim, acompanhado com Orquestra.Ao longo de sua trajetória somam-se mais de 30 prêmios, inúmeras participações em festivais da Amazônia e em outros Estados.