domingo, 30 de dezembro de 2012

A Psique do Autor - Um reflexão do centenário de “A Metamorfose” de Franz Kafka

Nem sempre a natureza humana é apresentada de uma forma boa e compreensível. Muitas vezes ela chega a ser repulsiva, desprezível, pessimista e até mesmo desumana em algumas obras literárias e é assim que Franz Kafka (1883-1924) presenteia o mundo com uma das maiores histórias já lidas pelo homem,  A Metamorfose, que em 2012 completa 100 anos. Traz à tona a alma humana, sempre cheia de conflitos existenciais, angústias e preocupações. 

A obra narra a atormentada história de Gregor Samsa, um caixeiro-viajante que se vê obrigado a suportar todas as despesas da família, e que certa manhã, ao acordar para o trabalho, constata que se transformou num inseto. 

Trecho: "Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco inseto. "


De início, as suas preocupações giram em torno da impossibilidade de cumprir as obrigações profissionais e manter o sustento da família, mas perante a repulsa familiar (com exceção da irmã, que apenas no início, o alimenta), Gregor Samsa inicia um complexo processo interior de metamorfose, que o conduz a uma análise do seu contexto familiar e social.  Em nenhum momento, Samsa se questionou do por quê daquela transformação.

No decorrer da narrativa, todos recusam ajudar Samsa, remetendo-o à sua solitária agonia e diante deste cenário, uma nova metamorfose acontece: o pai, a mãe e a irmã voltam a trabalhar e a família decide buscar um futuro onde não existe lugar para o personagem principal, sendo ele na visão da família um monstro repugnante. 
Em um determinado trecho do livro, o protagonista pensa que a sua morte poderia ser uma alívio par todos, até para si mesmo.

"Esse sacrifício e transformação na própria carne para salvar o outro, mesmo que às vezes sem se dar conta disso, aparece de forma extrema na “Metamorfose”. Assim, podemos nos questionar sobre qual é o real valor do ser humano perante a sociedade e até mesmo perante os seus." (FARINA, 2007)

Alguns críticos afirmam que o livro tem senso autobiográfico e psicológico do autor Franz Kafka, quando trata do pai de Samsa, o qual é rígido, opressor e até mesmo bruto (quando expulsa o filho da sala, atirando maçãs nele). Sabe-se que a relação de Kafka com o pai Hermann Kafka não era das melhores e isso foi tratado também em seu outro livro: "Carta ao Pai" (1919), quando declara que se sentiu profundamente afetado pelo autoritarismo do mesmo.

O clássico é uma metáfora sobre o absurdo da condição humana, num espetáculo que explora na narrativa uma visão sombria, porém verdadeira da natureza humana, pois enquanto Samsa que virou um inseto, sente intensamente as ações (possui sentimentos verdadeiramente humanos) a sua família (que "estão" humanos), cada vez mais se tornam desumanos com a condição daquele que os sustentava. 

Talvez, também seja possível entender essa metamorfose do homem em animal como uma perda de identidade. Por isso, "A Metamorfose" é um dos clássicos mais fantásticas de Franz Kafka e da literatura do século XX.  É uma obra-prima que transpassou um século e continua atormentar e gerar reflexão sobre a natureza humana. 



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